A crítica literária ainda importa na era dos booktokers?

Nos últimos anos, um novo fenômeno tomou conta do universo literário: o BookTok. O termo, derivado da fusão entre “book” e “TikTok”, representa uma comunidade vibrante de leitores que compartilham recomendações, resenhas emocionais e listas de leituras virais. O impacto foi tão significativo que editoras e livrarias começaram a prestar atenção nesse movimento, reposicionando títulos antigos e apostando em lançamentos voltados para essa nova audiência digital.

Com isso, surge uma questão inevitável: em um mundo onde um vídeo de 30 segundos pode transformar um livro esquecido em um best-seller, ainda há espaço para a crítica literária tradicional? Ou será que a crítica está se reinventando para acompanhar essa nova dinâmica?

Este artigo investiga a relevância da crítica literária na era dos booktokers, analisando como a popularização da recomendação informal alterou o consumo de livros e questionando se a análise aprofundada ainda tem lugar em um cenário dominado pelo imediatismo e pela viralização.

O BookTok revolucionou o mercado editorial, transformando recomendações espontâneas e emocionais em poderosas ferramentas de venda. Mas, com um simples vídeo de 30 segundos influenciando o consumo literário, será que ainda há espaço para a crítica literária tradicional?

A resposta é sim — mas com adaptações. Enquanto o BookTok engaja leitores e impulsiona livros, ele nem sempre promove discussões aprofundadas sobre qualidade literária, estilo e impacto cultural. A crítica literária, por outro lado, oferece essa análise, ajudando a compreender obras além do hype momentâneo.

Em vez de se anularem, BookTok e crítica literária podem coexistir e até se complementar. Muitos booktokers já incorporam elementos da crítica tradicional em seus conteúdos, enquanto críticos exploram novas plataformas para dialogar com um público digital. No fim, o importante é incentivar a leitura e enriquecer a experiência dos leitores, independentemente do formato.

O fenômeno do BookTok e sua influência

Vocês lembram da gringa que há algum tempo falou sobre a experiência dela lendo Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis? a americana Courtney Henning Novak movimentou as redes e fez o livro subir de posição entre os mais vendidos da Amazon durante o período do hype. Pois é, esse é apenas um dos inúmeros exemplos do impacto que o BookTok tem sobre o mercado editorial. Um vídeo viral pode dar uma sobrevida inesperada a um clássico ou transformar um autor desconhecido em um fenômeno de vendas.

Mas o que torna as recomendações dos booktokers tão poderosas? Primeiro, a linguagem acessível e apaixonada. Diferente da crítica literária tradicional, que muitas vezes se apoia em conceitos técnicos e um vocabulário mais analítico, os influenciadores do BookTok focam na experiência de leitura, na conexão emocional com a história e na identificação com os personagens. O público, por sua vez, sente-se mais próximo e confia nessas recomendações espontâneas, feitas por pessoas comuns, sem a aura acadêmica que pode afastar leitores casuais.

Além disso, o algoritmo do TikTok favorece conteúdos dinâmicos e envolventes, permitindo que livros específicos ganhem visibilidade rapidamente. Editoras e autores passaram a monitorar tendências e até mesmo adaptar capas e campanhas de marketing para se alinharem ao que viraliza na plataforma. Isso demonstra como a dinâmica de consumo literário mudou: não são mais apenas os críticos especializados ou os grandes veículos de imprensa que determinam quais livros serão lidos, mas sim uma comunidade digital que valoriza engajamento e emoção acima de qualquer análise aprofundada.

No entanto, essa nova lógica de recomendação levanta questionamentos: será que um livro bem avaliado no BookTok é, de fato, um livro bem escrito? A viralização garante qualidade literária ou apenas responde a um apelo emocional do momento? Essas questões nos levam a refletir sobre o papel e a relevância da crítica literária no meio desse cenário em constante transformação

A crítica literária perdeu espaço ou se reinventou?

Diante desse novo panorama, uma pergunta essencial surge: a crítica literária perdeu sua influência ou apenas encontrou novas formas de se manifestar? Para responder a essa questão, é preciso entender que a crítica sempre foi um reflexo da cultura de sua época. Se antes ela estava restrita a jornais e revistas especializadas, hoje precisa disputar atenção em meio a vídeos curtos, resenhas emocionadas e um público que valoriza mais a conexão pessoal com a leitura do que uma análise técnica.

Isso não significa, porém, que a crítica literária tenha desaparecido. Pelo contrário: ela está se adaptando. Muitos críticos tradicionais migraram para o ambiente digital, explorando formatos como newsletters, podcasts e vídeos no YouTube para se aproximar de um novo público. Além disso, alguns booktokers vêm incorporando elementos da crítica literária clássica em seus conteúdos, buscando equilibrar emoção e análise técnica.

Outro ponto importante é que, enquanto o BookTok pode impulsionar vendas e gerar entusiasmo em torno da literatura, ele raramente propõe discussões mais profundas sobre estilo, estrutura narrativa e impacto cultural das obras. É aí que a crítica literária ainda tem um papel fundamental: oferecer um olhar mais analítico e contextualizado, que vá além da efervescência momentânea das redes sociais.

Portanto, longe de estar obsoleta, a crítica literária está em um momento de transição. Seu desafio agora é encontrar um meio-termo entre a profundidade da análise tradicional e a acessibilidade que o público digital busca. Afinal, a literatura continua sendo um espaço de debate, interpretação e descoberta — e a crítica, de alguma forma, sempre estará presente nesse processo.

Choque de gerações ou evolução natural?

BookTok e crítica podem coexistir?

Diante das mudanças no cenário literário, é possível encontrar um equilíbrio entre a crítica literária tradicional e a influência do BookTok? A resposta parece estar na complementaridade entre essas duas formas de abordar a literatura. Enquanto os booktokers conseguem engajar leitores e despertar interesse por livros de forma acessível e emocional, a crítica literária pode oferecer um aprofundamento que enriquece a experiência de leitura.

A coexistência entre essas duas abordagens já pode ser vista na prática. Alguns influenciadores literários passaram a incorporar análises mais detalhadas em seus conteúdos, trazendo conceitos da crítica tradicional para um público que, de outra forma, talvez nunca tivesse contato com esses aspectos da literatura. Ao mesmo tempo, críticos literários vêm explorando plataformas digitais para alcançar leitores que não costumam consumir resenhas acadêmicas ou artigos especializados.

Além disso, o próprio mercado editorial reconhece o valor de ambas as abordagens. Se, por um lado, as editoras investem em campanhas voltadas para viralizar livros no TikTok, por outro, ainda buscam legitimidade por meio de prêmios literários, análises aprofundadas e publicações especializadas. Isso demonstra que o valor da crítica literária não foi apagado — apenas se tornou uma peça de um quebra-cabeça maior, no qual a recomendação digital e a análise técnica podem caminhar juntas.

No fim das contas, a literatura é uma experiência plural, e diferentes formas de crítica e recomendação podem coexistir. Se o objetivo final for incentivar mais pessoas a lerem e explorarem novas histórias, então tanto o BookTok quanto a crítica literária estão cumprindo um papel essencial na cultura contemporânea.

Para fechar: e agora, qual o futuro da crítica literária?

Depois de tudo isso, voltamos à pergunta central: a crítica literária ainda importa na era dos booktokers? A resposta não poderia ser outra senão um sonoro “sim” — mas com nuances.

O BookTok transformou o cenário literário, tornando a leitura mais acessível e empolgante para um público jovem e digital. Ele quebrou barreiras, impulsionou livros para além dos círculos acadêmicos e provou que a literatura pode, sim, ser um fenômeno pop. No entanto, por mais que a emoção e a identificação pessoal sejam fatores essenciais na experiência de leitura, elas não substituem a importância de um olhar mais profundo sobre as obras.

A crítica literária, quando bem aplicada, nos ajuda a compreender não apenas o que lemos, mas como lemos. Ela contextualiza histórias, investiga estilos, analisa impactos culturais e desafia nossa percepção. Sem ela, corremos o risco de nos contentarmos com leituras superficiais, pautadas apenas pelo hype do momento.

No fim, não se trata de BookTok versus crítica literária, mas sim de entender como essas forças podem coexistir e se complementar. Enquanto um nos leva a descobrir novos livros com paixão e entusiasmo, o outro nos ensina a apreciá-los de maneira mais rica e reflexiva.

A literatura nunca foi feita para ser unilateral, e é justamente essa multiplicidade de olhares que mantém sua relevância viva.

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